Oi, professor(a)! Hoje vamos falar sobre ser professor em escola particular e como, muitas vezes, o que é vendido como "excelência" esconde práticas abusivas e desumanas. Vamos começar!
Muitos professores entram na rede privada com a esperança de melhores salários, mais estrutura e reconhecimento profissional.
No entanto, o que encontram é um ambiente de pressão constante, metas inalcançáveis e uma lógica de trabalho que não respeita os limites humanos.
A cobrança vem disfarçada de “comprometimento”, a sobrecarga é chamada de “excelência pedagógica” e o silêncio é comprado com medo e insegurança.
Recentemente, uma colega de profissão me confidenciou que vinha sofrendo abusos constantes na escola particular onde trabalhava.
Era convocada a participar de eventos quase todos os sábados, sem qualquer remuneração extra.
O dono da escola alegava que isso fazia parte da “entrega de valor” da instituição. Por mais que ela questionasse, nunca recebeu pelos sábados trabalhados.
A cada nova exigência, o discurso era o mesmo: “Aqui prezamos pela excelência”. Mas a verdade é que ela estava exausta, emocionalmente abalada e cada vez mais sem forças.
Essa realidade não é um caso isolado. É uma estrutura que se repete em muitas instituições privadas, e precisamos falar sobre isso.
Abusos e sobrecarga docente: quando a excelência esconde o desgaste
Em muitas escolas particulares, há uma cultura de performance que sufoca.
O professor precisa sorrir, inovar, gravar vídeos, participar de eventos, estar disponível no WhatsApp da turma fora do expediente e entregar resultados – sempre com entusiasmo.
Questionar essas demandas é visto como sinal de descompromisso ou “falta de perfil”.
A excelência, nesse contexto, se transforma em opressão. Reuniões em horários não remunerados, pressão por resultados de avaliações externas, participação obrigatória em feiras, festas e eventos nos finais de semana... tudo isso sem previsão em contrato e sem remuneração adequada.
De acordo com dados da Associação Nova Escola (2023), 68% dos professores da rede privada afirmam que trabalham além do seu horário contratado semanalmente. Desse total, 40% dizem não receber por esse tempo extra.
Essa cobrança constante faz com que muitos professores se sintam em dívida com a escola, como se nunca estivessem fazendo o suficiente.
E quando se tenta impor limites, o medo de ser substituído fala mais alto. Afinal, sabemos que nas escolas particulares, o discurso é: “Se não quiser, tem quem queira”.
Impactos na saúde física e emocional dos professores
A exposição contínua a esse tipo de ambiente tóxico tem consequências profundas. Problemas como ansiedade, insônia, crises de pânico e depressão têm sido cada vez mais comuns entre professores da rede privada.
Um levantamento feito pela Fundacentro e o Dieese (2022) aponta que o adoecimento psíquico é a terceira maior causa de afastamento de professores no setor privado. E muitas vezes, quando o docente busca ajuda, se vê sozinho, sem respaldo da instituição.
O tempo que deveria ser dedicado ao planejamento e ao descanso é engolido por reuniões, eventos e tarefas extras que não estavam previstas no contrato.
A vida pessoal se resume a sobreviver até o próximo recesso. Não há espaço para lazer, autocuidado ou mesmo convívio familiar de qualidade.
A ideia de vocação docente, tão romantizada, acaba sendo usada como justificativa para abusos. Como se amar ensinar significasse aceitar qualquer condição imposta pela escola.
O medo de dizer não e o risco de ser “substituível”
Dentro desse contexto, muitos professores têm medo de recusar tarefas ou questionar as regras.
A rotatividade nas escolas particulares é alta, e os contratos temporários alimentam ainda mais a instabilidade.
A cultura da meritocracia educacional reforça a ideia de que o professor “excelente” é aquele que faz mais, que aceita tudo e nunca reclama.
Uma professora que se recusa a participar de eventos aos sábados pode ser vista como "desalinhada com a cultura institucional". E isso pode significar, na prática, o fim de um contrato no semestre seguinte.
Esse silêncio coletivo, imposto pelo medo, é o que mantém o sistema funcionando. E é exatamente por isso que precisamos quebrar esse ciclo e fortalecer espaços de escuta e denúncia.
Existe saída? Como resistir ao sistema sem se calar
Apesar de tudo isso, ainda há caminhos possíveis de resistência. A primeira saída é reconhecer que esse tipo de exigência sem remuneração fere os direitos trabalhistas.
Participar de eventos fora do horário, reuniões aos sábados, plantões em feiras e festas escolares devem ser previamente acordados e pagos. Se não estão em contrato, são abusos disfarçados de zelo institucional.
Organizar-se coletivamente com colegas da mesma escola pode ser o início de uma mudança. Levantar pautas comuns, escrever documentos coletivos, buscar orientação jurídica são estratégias viáveis e necessárias.
Os sindicatos, mesmo que muitas vezes enfraquecidos, ainda são espaços de proteção e denúncia.
Além disso, há plataformas como o Professores Contra o Abuso, que acolhem relatos e orientam juridicamente casos de assédio e exploração na rede privada.
Outro ponto fundamental é o autocuidado. Reconhecer os próprios limites, buscar apoio psicológico e não se sentir culpado por dizer “não” são passos essenciais para preservar a saúde mental e a dignidade no exercício da docência.
Como denunciar abusos contra professores
Se você já foi ofendido em sala de aula, sentiu medo de um aluno, sofreu perseguição da gestão ou foi humilhado por pais, saiba: você não está sozinho.
A violência contra professores tem crescido de forma alarmante no Brasil.
É comum ouvirmos relatos de agressões físicas, assédio moral, ameaças e humilhações que simplesmente são ignoradas pelas instituições. Isso adoece. Silencia. Isola.
A rotina escolar, muitas vezes, se torna um campo de resistência. E não deveria ser assim. Somos profissionais da educação, com formação, responsabilidade social e papel fundamental na transformação de vidas.
Ainda assim, estamos sendo atacados. Segundo pesquisa do Instituto Datafolha em parceria com o Todos Pela Educação (2023), 29% dos professores afirmam já ter sofrido algum tipo de agressão verbal ou física dentro da escola.
O número assusta e piora quando consideramos que a maioria não denuncia, seja por medo de represálias, por descrença no sistema ou por falta de conhecimento sobre seus direitos.
Denunciar um abuso não é fácil, mas é necessário. O primeiro passo é reconhecer que o que você está enfrentando não é normal e não faz parte da sua função docente.
A escola não é espaço para ser ofendido, ameaçado ou ignorado. E muito menos para adoecer em silêncio.
Se você sofreu uma agressão verbal, física, assédio moral ou qualquer tipo de abuso, registre o ocorrido.
Anote dia, horário, contexto, nomes de envolvidos e, se possível, busque testemunhas. O registro é fundamental para dar início a qualquer processo de denúncia. Vale também guardar mensagens, áudios, prints ou qualquer material que comprove o ocorrido.
Em seguida, é importante procurar a direção da escola. Formalize a denúncia por escrito e solicite resposta. Caso não haja acolhimento — o que infelizmente é comum —, procure a Secretaria Municipal ou Estadual de Educação.
Leve todos os registros. Exija providências. As secretarias têm obrigação de proteger os profissionais da rede, e a omissão também pode ser denunciada.
Outro caminho é o sindicato da sua categoria. Os sindicatos oferecem apoio jurídico, acompanhamento psicológico e orientações detalhadas sobre os procedimentos legais.
Não enfrente isso sozinho(a). Procurar o sindicato é um ato de autocuidado e defesa da profissão.
Se o caso envolver agressões físicas, ameaças graves ou situações que coloquem sua integridade em risco, vá à delegacia e registre um Boletim de Ocorrência (B.O.).
Dependendo da gravidade, a denúncia pode ser feita na Delegacia de Defesa da Mulher (se for o caso) ou em delegacias especializadas em crimes contra servidores públicos.
Lembre-se: o professor é servidor público e está amparado por leis como a Lei nº 13.185/2015, que trata do combate à intimidação sistemática (bullying), e o Código Penal, que pune ameaças, agressões e calúnias.
Também é possível denunciar de forma anônima. O Disque 100 (ligação gratuita) recebe denúncias de violações de direitos humanos, incluindo agressões a profissionais da educação.
Há ainda canais como a Ouvidoria do Ministério da Educação e o Ministério Público Estadual, que podem ser acionados quando há omissão institucional.
Muitos professores me perguntam: “Vale a pena denunciar?” E eu sempre respondo com firmeza: vale. Vale pela sua saúde mental. Pela sua dignidade.
Pela sua profissão. Vale para que outros colegas não passem pelo mesmo. O silêncio alimenta o abuso. A denúncia, mesmo que difícil, abre caminho para mudanças.
Infelizmente, vivemos um cenário onde o professor é cada vez mais desvalorizado. O autor brasileiro Daniel Cara, especialista em políticas públicas de educação, já alertou que a precarização do trabalho docente é um projeto estrutural que precisa ser enfrentado coletivamente. Denunciar é parte desse enfrentamento.
Se você está se sentindo esgotado(a), sem forças ou não sabe por onde começar, busque apoio psicológico.
Diversas redes municipais têm convênios com centros de acolhimento. E mesmo que não tenham, você tem direito de buscar esse cuidado via SUS, CAPS ou serviços especializados em saúde do trabalhador. Você não precisa lidar com isso sozinho(a).
Nossa profissão exige muito. E não podemos permitir que a violência silencie nossa missão. Denunciar não é apenas um ato de coragem — é um grito por respeito. É dizer: eu existo, eu ensino, eu importo. E ninguém tem o direito de me violentar.
Conclusão
Ser professor em escola particular não deveria significar abrir mão da própria vida em nome de um ideal de excelência que só serve ao marketing da instituição.
Excelência verdadeira pressupõe respeito aos profissionais, valorização do trabalho docente e condições dignas de atuação.
A história da minha colega é um alerta. Nenhuma entrega pedagógica justifica a exploração de quem ensina. Nenhum projeto de excelência pode ser construído sobre o adoecimento e o silêncio de quem está na linha de frente.
Se você também vive essa realidade, saiba que não está sozinho(a). Falar sobre isso é um ato de coragem e resistência. E é apenas falando que podemos, juntos, mudar essa lógica.
Gostou do conteúdo? Compartilhe com outros professores, comente aqui embaixo sua experiência e deixe sugestões de temas para os próximos textos.
Se você chegou até aqui, eu tenho um recado:
Uso um pacote de Geografia do 6º ao 9º ano com tudo pronto — e recomendo de
olhos fechados.
Leia mais...
0 Comentários
Gostou do conteúdo?
Compartilhe e participe do debate deixando seu comentário.
Inscreva-se para receber novidades!
Faça parte da nossa comunidade de aprendizado.
Obrigada por ler e compartilhar!
Professora Camila Teles